Publicado em:
2/12/2022
“E então é Natal, e o que você fez?” Chega o final do ano e a clássica música natalina nos convida à reflexão. Você, absorto na rotina diária sem nem perceber a chegada de dezembro, vê-se subitamente refletindo: “é final do ano, e o que eu fiz?”.
Seja pela música, pela constatação do fim do calendário ou pelo prazer das reflexões cíclicas, certamente este balancete anual pode evocar diferentes sentimentos, agradáveis ou não tão agradáveis assim. Caso se depare com a segunda opção, confira aqui algumas perspectivas da psicologia para lidar melhor com eles.
No final do ano começamos a ser sobrecarregados com reprises, mensagens reflexivas e dicas de como “realizar os desejos de ano novo”, sem contar com as infindáveis postagens dos amigos e colegas nas redes sociais com textos reflexivos sobre todas as vivências e desafios percorridos no último ano.
Querer compartilhar esses momentos de “fechamento de ciclo” faz sentido: somos a espécie mais social da natureza. Na nossa história evolutiva, viver em grupo e observar outras pessoas foi extremamente importante. Hoje, uma das principais variáveis para a felicidade humana é a qualidade das nossas relações, sendo essas geradoras das emoções mais profundas que podemos experienciar, como amor, paixão e ódio. Nossos relacionamentos sociais são tão importantes que constam como um dos pilares de um estilo de vida saudável, tal qual alimentação, sono e atividade física.
O uso das redes sociais ou o acompanhamento de notícias traz uma percepção e sensação de conexão social. Porém, é importante ter cuidado com esse consumo. Estudos apontam que o uso excessivo destas redes está associado a sintomas de depressão e ansiedade.
Tema recentemente abordado de forma divertida na trend do instagram com a tag “fora do instagram a gente tá como”, nas redes sociais frequentemente interagimos com conteúdos que retratam uma vida ideal. A exposição frequente a estímulos que romantizam a vida cotidiana, tais como o que é exposto nas redes sociais, pode funcionar como um convite à comparação. Nessa avaliação entre o que se tem e o que o outro aparenta ter, uma sensação de perda ou injustiça pode surgir.
Em relação às notícias, são meios de capturar nossa atenção e gerar um certo senso de urgência. A rápida retrospectiva dos acontecimentos do ano, muitas vezes pontuados por coisas ruins, pode fazer-nos julgar que certos eventos são mais prováveis do que realmente são. Isso ocasiona em um pessimismo generalizado e faz-nos estar em um estado de sempre estar alerta, alimentando ansiedades e inseguranças.
Estes dois exemplos de pontos extremos - para os retratos da felicidade ou de catástrofes - interferem na forma como processamos a realidade e podem afetar nosso estado de humor. Vale lembrar que não existe nada “8 ou 80”. Existem 27 emoções diferentes identificadas até o momento e, na prática, estas podem variar amplamente frente a cada estímulo que nos é apresentado ao longo do dia. Por isso, o ideal de “estar sempre feliz” se torna tão frustrante, assim como é totalmente irreal acreditar que se “estará sempre infeliz”. O primeiro passo é aceitar que teremos que lidar com esse turbilhão desenfreado de emoções, pois só assim podemos saber o que esperar e aprender a lidar com ele. Vale também se atentar se a exposição a estes estímulos é excessiva, reduzindo-a em caso afirmativo.
Não é incomum que nesse balanço de final de ano identifiquemos metas não atingidas e façamos mais uma vez a listinha de objetivos para o novo ano. Nesse meio tempo, podemos ser invadidos pela sensação de falha ou falta de tempo.
No meio de toda a correria do dia-a-dia, é super interessante ter momentos de reflexão e planejamento,que permitam um direcionamento para objetivos de longo prazo e uma reavaliação de onde se está nesse caminho. Contudo, isso não precisa ocorrer só no final do ano. Pensar em momentos de checkpoint ao longo do ano, podem tirar um pouco dessa carga que a "retrospectiva do ano que termina” traz, transformando este em mais um momento comum de auto reflexão e planejamento de próximos passos. Estes checks mais frequentes também ajudam a construir metas menores, mais tangíveis e concretas, favorecendo o progresso. Além disso, vale considerar imprevistos (pois eles vão ocorrer) e pensar em estratégias para lidar com eles, entendendo que estes fazem parte do nosso dia-a-dia.
Outro ponto de atenção é que tendemos a focar nos “grandes marcos e conquistas” esquecendo que refletir sobre as pequenas coisas que podemos comemorar e ser gratos, pode ter um grande impacto na nossa percepção de mundo e sensação de bem-estar. Como bem retrata Guimarães Rosa: a felicidade está nos descuidos.
Você pode tentar agora mesmo: feche os olhos e pense em 3 pequenas coisas pelas quais é grato. Pode ser algo como seu bichinho de estimação, uma palavra de carinho que recebeu hoje ou até mesmo por ter lido esse texto, se ele fez sentido para você :)
Ao ver metas não cumpridas, quem de nós nunca teve que lidar com aquela voz julgadora que vive na nossa cabeça e resolve aparecer nos momentos mais inoportunos, com uma nada doce palavra de desincentivo.
Na terapia cognitivo-comportamental de Beck, acredita-se que diferentes pessoas interpretarão diferentes situações de formas distintas. Sendo assim, não é a situação em si que determina os sentimentos, mas sim como, com base nas vivências de cada um, se interpretam tais situações.
Ao longo de nossas vidas formamos nossas crenças fundamentais, que por sua vez impactam nossa percepção do mundo. São como as “lentes” a partir da qual processamos e entendemos a realidade. Algumas dessas crenças podem acabar sendo disfuncionais e impactar negativamente no nosso dia-a-dia por meio de pensamentos automáticos, que parecem julgar com mais rigidez do que um juiz inflexível.
Estes pensamentos automáticos podem ser modificados, por meio de sua identificação e discussão, para alternativas mais funcionais e adequadas.
Vale sempre lembrar que cada um de nós enfrenta desafios diferentes, de formas diferentes. A comparação é mais produtiva quando colocada a nível individual , entendo que:
Por fim, algo que pode ajudar é se perguntar, o que eu gostaria de ouvir de um amigo meu em um momento como este? Ou o que que falaria se aquela pessoa que gosto muito estivesse passando por isso? Adotar esta perspectiva externa tem resultados positivos na literatura, muitas vezes somos muito duros conosco mesmos, nesses momentos vale adicionar uma segunda voz, uma mais amigável e benevolente, que conforte nos momentos em que aquela outra voz está sendo muito dura com você.